segunda-feira, 24 de março de 2014 0 comentários

Meus exageros



       Você diz que precisa ir embora e eu quase vou junto pra não deixar de te ter por perto nem por um segundo. Você diz que me ama enquanto eu tenho vontade de gritar que você é o amor da minha vida e que eu não me lembro de como eu era antes de você. Você diz que está me conhecendo melhor porque pretende me namorar. Eu não falo nada, mas já imaginei nosso casamento, nossa futura casa e nossos dezessete gatos. Ou dezoito, se você preferir, já que gosta mais dos números pares. Você me abraça enquanto eu sinto seu perfume e me seguro pra não te pedir para ficar, não só agora, mas pra sempre. 
       Quando conheço alguém, em todas as ocasiões, eu tento deixar meus defeitos muito bem escondidos, pelo menos aqueles mais feios. Mas agora o caso é mais grave, porque eu o coloquei na minha vida de um modo quase que espontâneo e a cada vez me vejo mais envolvida. Ao mesmo tempo que quero conhecer cada canto seu, não quero que você veja minhas falhas e quem sabe pense melhor e quem sabe fuja de mim enquanto ainda há tempo. Você não sabe o quanto eu temo perder você. Você não faz ideia de como eu tomo todo o cuidado do mundo para não estragar tudo como sempre. Dessa vez preciso fazer tudo certo.
       O problema maior é que, apenas lendo este texto - ou qualquer outro que eu tenha escrito - é fácil perceber um dos meus grandes defeitos.
       Sou exagerada. Não sei amar pela metade ou sentir só um pouco de medo. Eu sinto tudo com uma intensidade muito grande. Ou seja, vou te amar de todo coração. Será que isso é tão ruim assim?
segunda-feira, 17 de março de 2014 0 comentários

O que os olhos não veem


       Eles se conheceram na praça do centro da cidade numa tarde ensolarada de dezembro. Ela era cega por nascença e ele ficou encantado com a ideia de que ela sempre aceitou a cegueira e gostava de imaginar as coisas que não podia enxergar. Ela dizia o que imaginava sobre a praça de um jeito quase poético, enquanto ele via a sujeira e o estado crítico em que ela se encontrava. Ela descrevia as mais belas flores e ele só encontrou um florzinha murcha no canto do banco. Era incrível a maneira de ela ver o mundo à seu próprio modo. Ele a olhava e dizia que ela era linda, mas ela não aceitava esse elogio. "Não importa como eu sou por fora. De que adianta ser linda? Eu não consigo enxergar a minha beleza exterior nem a de ninguém, então não é importante". 
       Eles passaram a se encontrar todos os dias naquela praça e ele estava cada vez mais apaixonado por aquele modo que ela tinha de imaginar as coisas. A melhor amiga dela um dia lhe falou que ele era estranho, mancava de uma perna e, convenhamos, não era muito bonito. Ela sorriu dizendo: "Você realmente acha que isso faz diferença para mim? Pra vocês que julgam as aparências uns dos outros pode até ser que faça diferença, mas eu gosto da pessoa que ele é, seja como ele for por fora".  
       Três anos depois, subiram ao altar.
       A beleza, definitivamente, não está nas aparências.
 
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